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Capítulo 32
Do Dilema


Métodos Lógicos e Dialécticos
Mário Ferreira dos Santos
I Volume
3a Edição (1962)
Enciclopédia de Ciências
Filosóficas e Sociais

Livro Original na Internet
32  Do Dilema

     Dilema (do grego dis, duas vezes e lambánô, captar, tomar, compreender) era chamado pelos antigos syllogismus cornutus (de duas pontas, cornos). É o argumento no qual, de dois ou mais membros propostos disjuntivamente, um dêles deve ser deduzido sempre. (Segundo o número de membros é trilema, tetralema ou quadrilema, polilema).

     Surge o dilema, como dissemos, da combinação do argumento disjuntivo com o raciocínio condicional.

     A forma do dilema é a seguinte:

     Ou S é P, ou P'

     Ora, êle não é P nem P';

     Portanto, êle não é.

     Se S é, êle não é nem P nem P';

     Ora, êle é P ou P';

     Logo S não é.

     As regras do dilema referem-se ora à verdade formal, ora à verdade real. Sob o ponto de vista formal, não oferece o dilema nada de particular. É uma espécie de raciocínio hipotético, que conclui modo tollendo. Quanto ao ponto de vista material, é uma arma que se tem esgrimido perigosamente, sobretudo pelos sofistas na Filosofia, e que permite transformar em ataque até para quem o maneja.

     O dilema correto exige: 1) que a disjunção seja completa; 2) que o consequente, que é deduzido do membro singular, decorra legítima e exclusivamente, de modo que o dilema não possa ser retorquido.

     Aulu-Gelle conta-nos êste exemplo: aceitara, o sofista Protágoras como discípulo um tal Evatlo, que lhe pagaria o preço de suas aulas de eloquência da seguinte maneira: metade à vista e a metade restante quando Evalto ganhasse a sua primeira causa. Como Evatlo não providenciasse em defender nenhuma causa, evitando, assim, pagar a Protágoras, êste o levou à justiça, e lhe disse:

     "Vós me pagareis, quer percais vossa causa ou a ganheis; se a perderdes, os juízes vos condenarão; Se a ganhardes, sereis meu devedor em virtude de nosso acordo."

     Evatlo aceitou a alternativa e replicou: "Eu não pagarei, poque ou ganho ou não o meu processo; se os juízes se pronunciarem a meu favor, estarei liberto de toda obrigação; e se me forem contrários, perco a minha primeira causa e não vos pagarei nada." Os têrmos são ambíguos. Tudo gira em tôrno de palavras de duplo sentido. Cada um interpreta ganhar ou perder a seu modo. O contrato não prevera o caso de Evatlo agir contra Protágoras.

     No dilema é mister que:

     1) a Maior seja completamente disjuntiva no consequente;

     2) que os casos que ela enuncia sejam os únicos possíveis e que todos dependam realmente do antecedente;

     3) que a menor repila inteiramente os membros da disjunção;

     4) que os têrmos sejam bem determinados para que o argumento não possa ser retorquido pelo adversário, que pode tomar os têrmos num outro sentido, como no exemplo que vimos. Para retorquir um argumento, basta tirar-se uma conclusão oposta, fundando-se exatamente sôbre uma das suas premissas.

     Como exemplo de uma disjunção falsa, Maritain cita o argumento abaixo muito usado pelos sofistas modernos: "Todo filósofo é inatista ou sensualista; se é inatista, cai no idealismo; se é sensualista, cai no materialismo; em nenhum caso o erro pode ser evitado." A disjunção é, porém, incompleta. Os que seguem a escola de Aristóteles não são nem inatistas nem sensualistas. Como exemplos de disjunção também falha, mostramos duas fundamentais da filosofia de Kant, em nosso "As Três Críticas de Kant", que servem depois de ponto de partida para o desenvolvimento da sua doutrina.

     Dilema semelhante usam os marxistas: ou um filósofo é materialista ou é idealista, ou, seja, aceita a antecedência do objecto sôbre o sujeito, ou a do sujeito sôbre o objecto. Deste modo, podem êles chamar de idealistas a todos os filósofos que não são materialistas. Como êsse "idealismo" é ridicularizado, porque os homens não nascem com as idéias, mas estas são construídas posteriormente, é fácil impressionar qualquer pessoa que desconheça filosofia ou que a conheça apenas superficialmente. Não é de admirar que tais argumentos provoquem tanta influência sôbre mentes primárias ou em intelectuais deficientes.