Livro de Urantia

Grupo de Aprendizes da Informação Aberta

Contato

Índice Superior    Vai para o próximo: Capítulo 12

Arquivos de Impressão: Tamanho A4.

Livro em Texto (txt).

Capítulo 11
Objecções kantianas e respostas correspondentes


Mário Ferreira dos Santos
Filosofia Concreta
Tomo 1o
Enciclopédia de Ciências
Filosóficas e Sociais
Vol. X

Livro Original na Internet
11  Objecções kantianas e respostas correspondentes
    11.1  Justificação dos princípios
    11.2  Quadro combinado das formas puras do juízo e das categorias, segundo Kant

     Damos algumas das famosas objecções apresentadas por Kant e pelos kantianos à Metafísica, acompanhadas das respectivas respostas.

     1) É lícito duvidar metòdicamente da possibilidade de uma ciência na qual não há nenhum consenso universal. Ora, a Metafísica revela não haver nela nenhum consenso universal, em face da variedade de opiniões, muitas vêzes contrárias que nela se revelam. Conseqüentemente, é lícito duvidar da possibilidade da Metafísica.

     Resposta: A maior seria válida se o consenso exigido não se desse quanto ao seu objecto nem quanto aos seus primeiros princípios. Ora, tal não se dá quanto à Metafísica. Pode não haver consenso universal quanto a todos, não, porém, quanto a alguns princípios e conclusões fundamentais.

     2) Na Metafísica são demonstradas proposições que são simultâneamente contraditórias e antinômicas.

     Resposta: Que possuam as proposições contraditórias e antinômicas a mesma solidez, absolutamente não é verdade. Realmente, algumas aparentam maior soma de evidência. As antinomias kantianas são artificiosamente construídas e apenas de validez aparente. Entre duas contraditórias, uma é necessàriamente falsa, e nunca ambas evidentemente verdadeiras.

     3) As incoerências assinaladas no sistema kantiano podem ser corrigidas. Conseqüentemente, tais incoerências não podem refutar êsse sistema.

     Resposta: As incoerências accidentais podem ser corrigidas, mas que as substanciais e fundamentais possam ser corrigidas só o serão contra a sua doutrina, impedindo inelutàvelmente de conservá-la como verdadeira.

11.1  Justificação dos princípios

     Segundo a posição clássica da filosofia aristotélico-escolástica, quando não se dispõe de uma evidência imediata do ser, resta-nos a esperança de nos servirmos de uma evidência mediata, que é o raciocínio. Ora, o raciocínio exige, na lógica aristotélica, pelo menos uma premissa geral, pois não é possível de duas particulares concluir vàlidamente. O velho aforismo "Nil sequitur geminis ex particularibus umquam" é uma das regras fundamentais do silogismo.

     Como os juízos de consciência são sempre juízos sôbre factos particulares, não podem êles servir de premissas gerais. Impõem-se, portanto, para uma boa conclusão, premissas gerais, e a pergunta que logo surge é a de como é possível alcançá-las, já que todo juízo de consciência é particular, e a experiência é sempre particular. Sem chegar-se a este ponto, e justificá-lo, compreende-se que é um problema obter e fundamentar princípios universais.

     Sabemos que a inducção pressupõe também um juízo geral como princípio fundamental, sem o qual, fundando-se apenas no particular, não poderá existir uma regra geral, senão provável. Para se dar, portanto, um progresso no conhecimento é mister que se dêem proposições gerais imediatamente inteligíveis, as quais os escolásticos chamavam "princípios".

     É mister, portanto, saber o que nos poderá dar ou fornecer juízos imediatos.

     Para responder a esta pergunta, argumentam do seguinte modo os escolásticos de todos os tempos: há um princípio, que é chamado o primeiro princípio, o de contradição, que se pode formular pelo enunciado aristotélico: "É impossível que o mesmo convenha e não convenha ao mesmo, ao mesmo tempo, e sob o mesmo aspecto." Não se entende por "mesmo" o mesmo predicado lógico, que não pode ser afirmado e negado ao mesmo tempo do mesmo sujeito lógico, mas como a mesma propriedade ou determinação real, que não pode convir e não convir ao mesmo tempo ao mesmo objecto real. O princípio de contradição aristotélico é antes de ser lógico um princípio ontológico; ou seja, não é apenas um princípio de pensar lógico. Sabemos que, pela lógica aristotélica, dois juízos contraditórios não podem ser ambos verdadeiros, porque não pode o mesmo objecto, ao mesmo tempo, ser e não ser. Contudo, é preciso não esquecer que êste princípio compreende duas limitações que são: "ao mesmo tempo" e "sob o mesmo aspecto", porque em distinto tempo, e em distinto aspecto, o mesmo pode ser e pode não ser. Assim o número 200 é grande e não grande. Grande quando se compara a 10 e não grande se é comparado a 5.000.

     Kant opunha-se ao emprêgo da expressão "ao mesmo tempo", porque limitava o princípio às relações temporais. Respondem os escolásticos modernos que essa anotação é improcedente, porque o princípio de contradição também se estende ao temporal, pois sem essa expressão seria válido apenas para o eterno e intemporal, como surge na enunciação de Parmênides.

     Outros escolásticos modernos substituem o enunciado acima pelo seguinte: "o que é, enquanto é, não pode não ser", pois a expressão "enquanto é" compreende "no tempo em que é".

     Contudo, o princípio de contradição teve seus objectores que apresentaram razões frágeis, quase sempre provenientes do desconhecimento claro do seu enunciado, e por não terem devidamente compreendido o seu alcance. Na verdade, nenhuma objecção séria foi apresentada em qualquer tempo, a não ser contra a fórmula de Parmênides, que diz: "o ente é, e é impossível que não seja", que leva a postular a absoluta necessidade do ser, e a afirmar a imutabilidade, a invariabilidade e a unicidade do ente, o que desemboca, fatalmente, no "panteísmo".

     Stuart Mill considera o princípio de contradição "como uma das generalizações mais primitivas e óbvias, fundadas na experiência", reduzindo-o a uma necessidade psicológica, que nos obriga a generalizar certos "factos". Põem em dúvida alguns autores modernos o valor ontológico dêsse princípio. É verdade que muitos argumentam com o devir, seguindo a linha de Heráclito, mas êsse argumento pode valer para o enunciado de Parmênides, não para o de Aristóteles.

     O conceito de ser e o de não-ser são incompatíveis, pois um exclui, lògicamente, o outro. Contudo, deve-se notar que o conceito de "não" é intuitivo e claro, e indica a recusa, a proclamação da ausência. Considerando-se assim o ser, poder-se-ia dar ao lado do não-ser, porque êste indica apenas a falta de ser. Não se define o não ser como incompatível ao ser, pois pode-se admitir a falta de um ente sem negação do ser, como a afirmação de ser não implica a negação do ser, a falta de um ser. Deve-se compreender que o princípio de contradição refere-se mais ao ente, que, pròpriamente, ao conceito de ser. Se aquêles se excluem, também se exclui a afirmação de ente e, simultâneamente, do não-ente, pois não se pode predicar ambos a mesma coisa e ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto, porque o ente, enquanto ente, é ente e não não-ente. O conceito de ser é originalmente um conceito positivo e seu enunciado não diz oposição ao não-ser, nem êste se define pela incompatibilidade ao ser, pois, originàriamente, só diz falta de ser.

     Não se pode dizer todo ente não pode não ser, mas sim que, enquanto é, não pode não-ser, segundo o enunciado de Aristóteles.

     Dêste modo, a oposição entre um ente e o não-ser não é necessàriamente uma oposição contraditória formal, mas é cogitável e possível, e a única oposição que há na linguagem escolástica é a contraditória material, a que se dá entre o subjectum habens formam e a forma oposta.

     Contradição haveria entre os juízos "um ser há" e "nenhum ser há", entre os juízos fundamentais da Filosofia Concreta "Alguma coisa há" e "Nenhuma coisa há", não, porém, entre "alguma coisa há" e "alguma coisa não há", pois são particulares e ambos podem ser verdadeiros. Cabe aqui uma ressalva: o juízo particular "alguma coisa não há" é tomado particularmente; se tomado universalmente, no sentido de dizer "não há alguma coisa", como querendo dizer "coisa nenhuma há", deixaria de ser particular para ser um universal negativo, e neste caso seria contraditório ao "alguma coisa há".

     Alegam alguns escolásticos que o princípio de contradição vale porque Deus o quer, pois se quisesse o contrário poderia êle sofrer restricções. Neste caso, não teria êle o valor ontológico necessário que se lhe dá, e que, na verdade, tem. Nós, porém, consideramos o princípio de contradição, como o fizemos em "Filosofia Concreta", pela relação opositiva de privação e posse. A afirmação indica a posse, e a negação a privação. Quando se atribui um predicado ao ser, atribui-se a presença do mesmo; quando se nega, recusa-se a presença, afirma-se a privação do mesmo no mesmo. Ora, colocado o princípio de contradição dêste modo, se a contradição fôsse ontològicamente possível, afirmar-se-ia o nada absoluto, porque afirmar a privação é afirmar absolutamente a não presença de qualquer predicado, o nada absoluto. Portanto, a única restrição que alguns escolásticos fizeram de que o princípio de contradição limitaria a omnipotência divina, é improcedente, porque o nada absolutamente não limita de modo algum, e não poder Deus criar um nada absolutamente não é deficiência de qualquer espécie.

     A incompatibilidade há entre a qüididade de ente e a de não-ser. Se essa qüididade se realizou alguma vez, não se pode admitir que não se realizou; se em alguma parte um ente existe realmente, não se pode admitir que não exista ao mesmo tempo. Ora, a experiência nos mostra que algo existe, e o prova de modo imediato. Conseqüentemente, o princípio de contradição tem absoluta validez ontológica32.

11.2  Quadro combinado das formas puras do juízo e das categorias, segundo Kant

     É importante salientar desde início a distinção clara que faziam os escolásticos entre ratio (raciocínio), intellectus (entendimento) e intellectus principiorum.

     Somos capazes de obter princípios imediatamente inteligíveis e de valor geral ao compararmos entre si as essências, que nos são dadas pelos conceitos abstractos. Nossa inteligência abstrai da experiência as essências, mas as relações necessárias, que se dão entre elas pela experiência, nós não a percebemos pelos sentidos, mas por um acto do entendimento, que é essencialmente distinto da experiência. Não é o resultado de um discurso, mas uma simples e imediata inteligência da relação essencial. Chamavam os escolásticos essa inteligência, que também pode referir-se à razão enquanto é capaz dela, de "intellectus principiorum", que corresponde ao nous de Aristóteles.

     Como pode dar-se um progresso no conhecimento do ser? Respondem os escolásticos que, para haver um progresso além da experiência imediata, é mister aplicar um princípio geral aos casos particulares, exigindo-se, ainda, que o conteúdo total do conceito do sujeito, em suma, do princípio, verifique-se no particular dado pela experiência. Exemplificam os escolásticos da seguinte maneira: dada uma figura geométrica, desejando aplicá-la ao princípio geral: "a soma dos ângulos de um triângulo é igual à soma de dois ângulos retos", é preciso verificar que esta figura é um triângulo, segundo o que é entendido no princípio. Dêste modo, se o conceito do sujeito, no princípio geral, contém mais do que o que é cognoscível por percepção no ente dado, não pode aplicar-se êste princípio a tal ente. Em suma, se a percepção (que é intelectivo-sensitiva) de um ente oferece-nos menor conhecimento do que o que está contido no conceito do sujeito do princípio geral, êste princípio não pode ser aplicado a tal ente; assim, a uma figura apenas de dois lados, formando um ângulo reto, não se poderia aplicar o princípio do triângulo, chamando-a de triângulo.

     Vejamos agora outro caso. Temos um princípio geral, cujo conceito de sujeito se dá na realidade, mas cujo predicado não indica nada mais do que um elemento ou vários elementos contidos no conceito do sujeito. Exemplifica-se com o seguinte princípio: "todo paralelogramo é um quadrilátero". Êste princípio é de uma evidência, mas inútil para o progresso do conhecimento.

     Pela percepção, verificar-se-ia que a figura é um paralelogramo, porque percebê-la como tal é percebê-la como quadrilátero, já que quadrilátero é um elemento do paralelogramo. Neste caso, a aplicação do princípio geral à figura dada não permite nenhum conhecimento que transcenda a percepção, e, dêste modo, não se obtém nenhum progresso no conhecimento.

     Para haver progresso é necessário que o predicado do princípio geral acrescente ao sujeito algo que não está contido neste. E o que é acrescentado tem de ser um outro predicado, que não é manifestado pela percepção no particular dado pela experiência; ou seja, o que se acrescenta ao conceito do sujeito não se funda nesta experiência.

     Como é possível tal operação? Dizem alguns que tal se obtém por meio de uma análise do conteúdo do conceito do sujeito. Entende-se por análise, a operação que consiste em reduzir-se em suas partes, em seus elementos, o conteúdo total do conceito do sujeito. Neste caso, a análise só pode dar o que já está incluído nêle. A análise não nos pode dar, portanto, o progresso desejado no conhecimento. Necessitamos princípios que realmente acrescentem ao sujeito predicados independentemente da experiência, o que implicaria um ultrapassar da experiência.

     Esta análise já havia sido feita pelos escolásticos, Kant a retomou, colocando como principal interrogação do seu sistema a seguinte pergunta: como são possíveis os juízos sintéticos a priori? Já examinamos a divisão dos juízos feita por Kant. Mas o importante está nos juízos sintéticos a priori, nos quais a adição do predicado se dá independentemente da experiência.

     Êstes juízos são o tema fundamental da crítica kantiana, como vimos. Até aqui nada colocava êle em oposição ao que os escolásticos já haviam feito. Mas, onde a divergência surge, está precisamente em afirmar ele que a união necessária do sujeito e do predicado é concebida como independente da experiência, e mais ainda, que os mesmos conceitos não provêm da experiência, nem podem ser comprovados como reais no sujeito, no ente. Dêste modo, Kant subjectiva todo "a priori". Os escolásticos chamavam de juízo explicativo, o juízo em que o predicado já está contido no conceito do sujeito, e de juízo extensivo, aquêle em que o predicado acrescenta uma nova propriedade ao conceito do sujeito.

     As expressões a priori e a posteriori foram de uso comum. Neste caso, poder-se-ia dizer que o juízo, no qual o predicado acrescenta ao sujeito uma propriedade ou determinação, independentemente da experiência, é um juízo extensivo a priori.

     Os neo-escolásticos repeliram por muito tempo a divisão dos juízos proposta por Kant pelas seguintes razões: todos os juízos obtidos por comparação de conceitos são analíticos, e êstes são os "a priori"; todos os juízos sintéticos são princípios experimentais, são "a posteriori"; neste caso não há juízos sintéticos "a priori". Tomando-se a posição racionalista, a doutrina de Kant é inaceitável, porque ela aceita que há princípios já contidos no conceito do sujeito. No entanto, a escolástica perfeitamente distinguia os juízos explicativos de os juízos extensivos a priori, embora não usasse as expressões juízos analíticos e juízos sintéticos.

     Admitiam os escolásticos, o que é evidenciado pela nossa experiência intelectual, que a mera comparação dos têrmos sujeito e predicado permite captar um indictium per se notum, que revela a fôrça do intellectus principiorum, o que aliás observamos de modo prático nas análises e nas concreções que realiza a Filosofia Concreta, ao comparar juízos entre si e conceitos entre si.

     O princípio de contradição é um exemplo de juízo extensivo a priori. Contudo, o princípio de contradição não traz, por si só, progresso ao conhecimento, mas, sim, o princípio de causalidade. Pondo de lado as várias maneiras de concebê-lo, nós sabemos que o princípio de causalidade afirma a dependência real entre todo ser contingente e a actividade de uma causa, do qual êle depende. Ora, êste princípio vai além da experiência. E é mister que se funde êle numa inteligência a priori para que tenha validez.

     Aqui é onde as divergências surgem na Filosofia, e também no campo da problemática dêste tema. Aristóteles enunciou o princípio de causalidade, fundado no movimento (kinesis), no qual verificava que tôda mutação de um ente requer uma causa. Não concebia Aristóteles a variação total de um ente ao ser causado, mas apenas parcial; por isso, não alcançou com clareza o conceito de criação. A filosofia cristã estende a necessidade da causa a todo ser contingente, até o seu último substractum. Santo Agostinho chamava: "a forma invariável, pela qual existe todo o variável". A expressão escolástica "omne quod fit habet causam", ou seja, tudo o que é feito tem causa, é a expressão do princípio de causalidade.

     Neste enunciado, a afirmação de que algo é feito, é concomitantemente a de ser feito por outro; portanto, a própria análise permite compreender claramente a causalidade. Contudo, afirmar que todo ser contingente é feito, já merece outro exame. Diz-se que é contingente o ser que não é necessário; isto é, o ser que pode ser e poderia não ser, aquêle que não tem em si sua plena razão de ser. O conceito de contingente não inclui, racionalìsticamente considerado, o de ser causado. É um proprium dêste conceito ser causado. Neste caso, estamos num juízo extensivo "a priori".

     Os racionalistas relacionavam o conceito de causa com o fundamento lógico, e Spinoza chegava a igualar causa com razão. Em suas análises, chegava a concluir não só que todo efeito tem necessàriamente uma causa, mas que tôda causa é uma causa que opera necessàriamente: "ex data causa determinata necessario sequitur effectus".

     Fundado nesta afirmativa, a metafísica racionalista seria puramente a priori. Leibnitz admitia êste princípio de Spinoza; contudo, não considerava como simplesmente equivalente razão e causa. Para êle, ser causado é um caso particular de ter razão. A necessidade de uma causa, deduzia êle de um princípio de razão suficiente mais geral, formulado por êle pela primeira vez, que pode ser enunciado dêste modo: nenhum facto pode ser verdadeiro e existente, nenhuma afirmação legítima, sem que se dê uma razão suficiente de por que é desta maneira e não de outra." Leibnitz considerava êste princípio um juízo puramente explicativo, um juízo analítico no sentido de Kant. Êste, posteriormente, opôs-se a esta concepção, após conhecer as críticas que o empirismo formulou, especialmente por Hume. Hume enunciava, dêste modo, o princípio de causalidade: o que começa a existir tem que ter uma razão de sua existência. Afirmava que esta proposição não é analítica, porque na representação do efeito não está contida a de causa. Hume não admitia a possibilidade de um juízo extensivo a priori. A proposição, portanto, tinha de fundar-se na experiência. Mas, como êle repele aqui tôda experiência, lògicamente não se podia admitir que se justificasse a necessidade de uma causa. Para ele, é apenas uma explicação psicológica, que nos é conveniente. Nós estamos inclinados a ver um fenômeno depois de outro; daí chegamos a idéia de causa e efeito. Kant concorda com Hume, que a proposição não é analítica, mas repele a interpretação psicológica. Por outro lado, afirma que apenas não pode fundar-se na experiência, pois há uma terceira possibilidade, que é o juízo sintético a priori. Para que tal juízo se dê, é mister que os conceitos que o formam sejam independentes da experiência, sejam categorias, e é mister, ainda, que se dê uma união dêsses conceitos a priori com a intuição a priori do tempo, conforme a lei do sujeito transcendental, pois os conceitos apenas nos podem dar juízos analíticos. O princípio de causalidade apenas diz o seguinte: que todo fenômeno supõe outro do qual êle segue necessàriamente. Como Kant distingue fenômeno de númeno, a causalidade só se aplica aos primeiros, salvando assim a liberdade quanto aos outros, ou seja não é aplicado às coisas em si.

     Não se poderia aplicar tal princípio ao que Kant chama as coisas em si?

     Examine-se o conceito de contingência. Contigente é o ser cuja essência é indiferente para ser ou não ser, ou o que pode ser e também pode não ser (quod potest esse et non esse). O que caracteriza um ser contingente é o começar a ser ou o deixar de ser. Um ser contingente começa a ser (incipit esse) no precípuo momento que começa a ser. Só se pode chamar de contingente a um ente dessa espécie. Ora, se um ente começa a ser, êle não é suficiente para ser em si mesmo, pois, do contrário, existiria antes de existir. E mesmo que viesse do nada, então o nada teria poder de realizá-lo, e do nada dependeria para ser, o que tornaria o nada sua causa, ou, então, veio de si mesmo, o que levaria ao absurdo que acima apontamos. Um ser contingente não tem em si suficiente poder de ser, e exige a acção de uma causa para ser, uma causa que o faça, ex-facere, e-ficiente. E essa causa eficiente é algo que, por sua actividade, determina algo a existir.

     O enunciado não há efeito sem causa é tautológico, e a maneira concreta de enunciar a causalidade é a que fizemos acima.

     Ademais a lei de causalidade não se aplica apenas aos sêres materiais, objecto da nossa intuição sensível, mas a todos os entes contingentes, sejam de que espécie forem. A lei de causalidade material, que afirma que "na natureza (material) todo processo está unìvocamente determinado, de maneira que a mesma causa produz sempre necessàriamente o mesmo efeito" é um enunciado parcial e regional do princípio de causalidade. Kant parece sempre referir-se a êsse enunciado quando se refere ao princípio de causalidade.

     O contingente não pode existir por si mesmo, pelos motivos já expostos. Conseqüentemente, um ser que adquire a existência (seu pleno exercício de ser), não pode adquiri-la de si mesmo. Não existe um ser contingente por si mesmo, de modo algum. E se não pode chegar a existir por si mesmo, necessita do influxo de outro para existir, cuja dependência é real e necessária, sem a qual não pode existir. Portanto, o ser contingente só pode existir porque é causado.

     Mas, qual é a evidência do princípio de causalidade: uma relação analítica ou uma sintética? É um juízo explicativo ou extensivo?

     Afirmar que um ser contingente não pode existir em virtude de sua essência é um juízo explicativo (analítico, para Kant) ; mas dizer-se que a determinação de sua existência só é possível por uma acção, é um juízo extensivo (sintético, para Kant). E justifica-se isso porque no conceito determinar-à-existência não se contém nada do modo e maneira como tal sucede.

     O juízo: "o que não existe por si tem que existir por outro" é extensivo.

     Examinemos agora o princípio de razão suficiente, cujo enunciado é o seguinte: tudo o que é (ou todo objecto) tem uma razão suficiente. Que se entende por razão? Entende-se "aquilo pelo (por o) qual" o objecto subsiste. E por aqui aponta ao que é por si mesmo ou por outro. No primeiro caso temos uma relação lógica da propriedade (o proprium) ao conceito essencial, como quando dizemos que um triângulo tem por si mesmo a soma de seus ângulos igual a de dois ângulos retos. No segundo caso, o por indica a relação real de dependência (causa). Portanto, o que não é por si mesmo (contingente) é por outro.

     E como demonstrar o princípio de causalidade, se, como diz Aristóteles, na Analítica, um princípio é precisamente o que não cabe demonstração por outro, pois, do contrário, não seria um princípio? Contudo, pode-se fazer por mostração, como o provamos em "Filosofia Concreta". Se não podemos do conceito contingente alcançar o ser causado, não se pode demonstrar que o "ser contingente e não ser causado" é o mesmo que "ser contingente e não ser contingente". Neste caso, o princípio de contradição auxiliaria a demonstração desejada. Tais demonstrações provariam que alcançamos a juízos extensivos a priori imediatamente inteligíveis.

     Comentando os argumentos de Tomás de Aquino, escreve De Vries estas palavras: "O modo como faz a redução do princípio de contradição demonstra que não a entende como puramente analítica. Analise-se, por exemplo, "a demonstração reductiva", que êle emprega ao expor sua primeira demonstração da existência de Deus pelo princípio: "o que se move, é movido por outro. Ver-se-a que, nesta demonstração, se supõe que sòmente pode ser reduzido algo de potência a acto por uma causa que se acha no acto ... (de potentia non potest aliquid reduci in actum, nisi per aliquod ens in actu). Esta proposição é, sem dúvida, um juízo extensivo. Tem-se, portanto, de concordar com Suarez que tôda demonstração reductiva, além de depender do mesmo princípio de contradição, depende de outro princípio, ou concedido ou inteligível por si, e, em concreto, sempre que se quer provar um juízo extensivo, depende-se de outro juízo extensivo, ou concedido ou imediatamente inteligível. O raciocínio (a ratio dos escolásticos) não pode substituir a inteligência imediata (o intellectus)."

     Alegam ainda alguns que a "intuição das essências" tem levado a muitos erros. Realmente, tal é procedente. Mas êsses erros são causa de má aplicação dos conhecimentos lógicos e dialécticos, o que não refuta de modo algum o emprêgo dêsse método, pois, quando realizado com segurança, evitam-se os erros e abusos comuns de filósofos menores.

     O que se revelou de todo êsse exame é o seguinte: ser contingente não implica o ser causado, em seu conceito. Contudo, a afirmação da contingência leva necessàriamente, por análise; a considerar que o ser contingente não dá suficiente razão à sua existência, pois não pode vir a ser por si mesmo, mas por outro, o que, comparando os juízos, aclara definitiva e necessàriamente a necessidade de ser causado por outro, e a enunciar o princípio de causalidade com absoluta segurança. Nós, porém, na "Filosofia Concreta", seguimos outros caminhos, os quais demonstraram de modo patente que se pode chegar ao princípio de causalidade com a suficiente apoditicidade desejada.

     Tudo isso demonstra de modo cabal que é possível juízos sintéticos a priori na Metafísica, o que justifica essa disciplina de modo definitivo, e responde aos erros de Kant, que são compreensíveis dada a sua formação filosófica e o desconhecimento que tinha do que de mais elevado já havia sido realizado na filosofia medievalista. E demonstra, também, a validez dos juízos virtuais, que êle nem de leve suspeitou.

     O que entretanto não se pode negar de positivo na obra de Kant é o grande papel que desempenhou para o progresso dos estudos gnosiológicos. Inegàvelmente, com êle, a preocupação sôbre o valor e a validez de nossos conhecimentos passou a ser tema dos mais variados estudos. Não que os resultados melhor obtidos e mais seguros viessem modificar essencialmente o que já haviam conquistado as especulações realizadas pelos grandes filósofos do passado. Tal, na verdade, não se deu. Ao contrário: as pesquisas, que se seguiram, quando robustecidas pela boa análise e pela melhor especulação, vieram em abono do que havia sido realizado. Contudo, há um contingente imenso de novas contribuições, que não podem ser menosprezadas, e devem, ao contrário, receber a valorização que realmente merecem.

     Os estudos esquematológicos, que preparam essa nova disciplina que chamamos Esquematologia, e que serviram de base para realizarmos nosso "Tratado de Esquematologia", devem, sem dúvida, a Kant um grande impulso.

     O exame da estructura de nossa mente, em suas funções principais, desde a sensibilidade, a afectividade até à intelectualidade, leva-nos a dedicarmo-nos ao exame dos esquemas, indo dos mais elementares e fundamentais do sensório-motriz até os esquemas eidético-noéticos que a intelectualidade constrói.

     Todo conhecer, desde o sensível até o mais intelectualizado, processa-se através de uma adaptação da esquemática dada previamente, que se acomoda aos factos ou às idéias para realizar as assimilações proporcionadas em parte a esquemática já existente, e à capacidade assimiladora do ser cognoscente. Dêste modo, todo conhecimento, seja de que espécie fôr, é sempre estructurado segundo esquemas prévios, que modelam os conhecimentos posteriores. Uma sensação bruta primitiva, informe, só podemos concebê-la na criança em seus primeiros momentos, quando a esquemática, que preside a adaptação psicológica, é constituída apenas dos primeiros esquemas do sensório-motriz de origem hereditária. Contudo, mesmo aí, ante as pesquisas já realizadas pelos mais conspícuos estudiosos, como Piaget, para citar o mais importante de nossos dias, mostram-nos que há, pelo menos, certas leis, certas ordenações, que presidem à tôda intuição sensível, e que a sensação bruta não deve ser considerada como algo totalmente informe, porque já revela certa unidade, diferenciação, etc.; ou seja, um seleccionar de aspectos que obedecem não só a normas de interesse do cognoscente, como também são modeladas pela estructura dos próprios esquemas acomodados, que só permitem uma assimilação proporcionada a êles, o que nos demonstra que o facto sensível, de qualquer forma, é sempre proporcionado a gama da esquemática acomodada. Dêsse modo, não há uma sensação bruta, informe, amorfa totalmente, mas já modelada de algum modo pela esquemátiea acomodada.

     Não chegamos ainda muito longe nos estudos esquematológicos. Ao contrário, estamos dando os primeiros passos e muito temos ainda a percorrer. Não é de admirar, portanto, que ainda possam surgir várias reviravoltas, retornos inesperados, avanços que não poderão ser confirmados, vacilações que inquietarão os observadores. Tudo isso se dá e ainda se dará. Mas, o que há de certo é que já conseguimos alguma coisa. E se parece pouco a muitos, podemos, contudo, estar satisfeitos em verificar que nos prometem muito mais, muito mais do que esperávamos, o que já é suficiente para nos encher de grande satisfação33.

     A leitura da obra de Kant nos mostra que desconhecia êle a longa elaboração de teoria do conceito construída pelos medievalistas. Caiu nos mesmos erros já refutados, como vimos ao tratar dos universais. Mas, cabe ainda aqui algumas observações no tocante a passagens de sua obra, que merecem ser esclarecidas e devidamente respondidas.

     As doze categorias afirma Kant que, de modo algum, podem ser descobertas nas sensações. Considerando-as naturalmente como subjectivamente subsistentes, a sua afirmação nada diz de novo, porque jamais nenhum grande filósofo afirmou que tivéssemos a sensação da quantidade ou da qualidade ou da relação ou da modalidade, tomadas como seres subjectivamente existentes, ou dados com subjectividade.

     Como não são dados pelas sensações, são, para êle, então, conceitos puros.

     O dilema é sempre o mesmo: o que não é apenas dado pela experiência é dado apenas pela mente. A possibilidade de uma terceira posição não a encontra Kant. Todos sabem que, na lógica, o dilema quando mal construído, é fonte e origem de muitas falácias.

     A solução aristotélica, que êle silencia ou desconhece, já dera a resposta ao dilema, mostrando que o conhecimento pode ter sua origem parcialmente nos sentidos, e parcialmente na mente, sendo o resultado final uma síntese dos dois.

     A conclusão de que as categorias são conceitos puros do entendimento, não procedentes da experiência, é uma decorrência do vício abstractista do raciocinar racionalístico, que êle tanto combateu, mas que terminou por adquirir, usando-o habitualmente.

     Há um famoso exemplo que usam os kantianos para mostrar a presença das categorias: Duas libras (quantidade) de oxigênio (substância) gasoso (qualidade) e uma libra (quantidade) de hidrogênio (substância) gasoso (qualidade) produzem sempre em conjunto (modalidade: necessidade, reprocidade) três libras (quantidade) de água (substância) líquida (qualidade).

     Mas, por si sós as categorias não são suficientes para determinar as leis fundamentais da experiência. Embora se lhes acrescente a intuição, é mister ainda acrescentar-se-lhes uma terceira fonte, que é a representação, que une a intuição com o entendimento.

     São conceitos empíricos os que se referem a coisas de nossa experiência e que têm representantes subjectivamente subsistentes, como casa, cão, árvore, etc. São conceitos puros as categorias. Conseqüentemente, para o kantismo, há esquemas empíricos e esquemas puros, conforme correspondam àqueles.

     Os esquemas puros são criados pela representação quando vincula a categoria pura com o tempo, que é forma da intuição. Assim, da substancialidade como conceito puro, constrói nossa mente o esquema de substância, como imagem de algo que deve subsistir no tempo. Da causalidade, forma o esquema de causa, como o de algo que no tempo produz outra coisa, segundo determinada regra, etc.

     Só há, pois, experiência humana quando trabalham juntas as três fontes do pensamento teórico; a sensibilidade, o entendimento e a representação que os une.

     Do funcionar conjunto dêssas três fontes, surgem, então: a sensibilidade das formas puras da intuição, as categorias puras (pelo entendimento) e, pela representação, seus esquemas. A confluência dêsse operar produz os princípios fundamentais do conhecimento teórico.

     É possível a experiência, segundo o princípio básico kantiano, graças à representação de que todos os dados estão necessàriamente vinculados entre si.

     Dêste princípio surgem as três "analogias da experiência", sôbre os quais se baseia tôda ciência da natureza:

     Todos êsses juízos estão constituídos de conceitos, que não revelam nenhum rastro da intuição sensível, afirmam os kantianos.

     Repetimos que um dos pontos fundamentais dos erros de Kant consiste no desenvolvimento da teoria da gênese do conceito. Os nossos esquemas, cujo estudo fazemos em "Tratado de Esquematologia", são dinâmicos e genuìnamente históricos; portanto, susceptíveis das influências da própria historicidade. Dêsse modo, o conceito varia segundo os ciclos culturais, as eras e, em suma, através das constantes mutações que sofre o homem. O que a filosofia concreta deseja é alcançar os conteúdos mais completos e seguros dos conceitos.

     Todo conceito está eivado de facticidade. Na Esquematologia, na gênese do conceito, sabemos que a sua formação atravessa fases das mais complexas, desde o anteconceito, do esquema fáctico singular, que é aplicado de modo geral e tende a universalizar-se, como se vê na criança, até atingir os conteúdos noemáticos mais gerais, abstractos, mais puros, até à conquista do conteúdo eidético puro, que é o ápice que deseja realizar a filosafia concreta.

     Um conceito empírico, como casa, árvore, etc., é prenhe de facticidade e seu esquema está saturado das imagens confusas dos diversos indivíduos conhecidos. Alcançar-se, na definição lógica, o conteúdo eidético-noético; ou seja, o eidos, que nosso nous pode construir, e atingir, então, a universalidade. Êsse conteúdo atravessa graus de purificação eidética e de afastamento constante da facticidade, até alcançar o meramente eidético, o que é possível de um modo muito mais efectivo quanto aos conceitos abstractos do que quanto aos conceitos empíricos.

     Inegàvelmente, a mente humana trabalha com os dados da intuição sensível, e com êsses realiza a ascese eidética, de que temos falado, que se processa através de uma actividade noética, que consiste no abstrair crescentemente os conteúdos eidéticos, até à formação eidética pura do conceito, como o demonstrou Tomás de Aquino, e o comprova a teoria da abstracção total, na Gnosiologia.

     Há, sem dúvida, leis da nossa mente que actuam nessa operação. Essas leis nós já as estudamos no "Tratado de Esquematologia", sem a ordenação das quais seria impossível a formação de conceitos. Como se poderia compreender a actividade humana abstractista, no bom e genuíno sentido do têrmo, sem a diferenciação, sem a unidade, sem a simultaneidade, sem a sucessividade, sem a correlatividade, que são fundamentais no existir, e que actuam na mente como modeladoras do conhecimento? Realmente, há formas da sensibilidade e, também, do entendimento, mas essas formas são pròpriamente leis modeladoras da actividade cognoscitiva desde seus primórdios até suas mais altas funções, como o demonstramos no "Tratado de Esquematologia". Certamente, há bastante positividade no pensamento kantiano, mas esquece-se êle de considerar a historicidade dos esquemas e sua actuação, também histórica, na formação dos conteúdos noemáticos até alcançar aos conteúdos puramente eidéticos, que é o ápice do conhecimento humano, enquanto tal.

     Podemos exemplificar até com a própria esquemática de Kant, analisando os conceitos que propõe.

     Tome-se para exame o conceito de substância e veja-se como varia o seu conteúdo esquemático:

     Ora, Kant restringe o conceito de substância ao tempo. Quanto a admitir que a sua quantidade, na natureza, não aumenta nem diminui é um acrescentamento seu e não da filosofia clássica, medievalista, que jamais deu à substância finita essa absolutuidade. Se o princípio de conservação da matéria, da energia, etc., foram tão caros à Ciência moderna, não o foram para a Filosofia, que não encontraria razões suficientes para afirmar tais absolutuidades. O conceito kantiano de substância tem um conteúdo noemático histórico, próprio do racionalismo. Se se procura o conteúdo eidético, teríamos de dizer o seguinte: na observação dos fenômenos percebe o homem que as variações observadas são variações de algo que perdura, e que é sustentáculo de tais variações. Um ser tem uma forma e suas variações e modificações são toleradas dentro dessa forma, do contrário o ser deixa de ser o que é, corrompe-se. O espectáculo do devir nos mostra que algo devém; ou seja, que algo permanece por entre as modificações. Estas são accidentais, é algo que acontece a alguma coisa que perdura. Substância é, assim, a estructura formalmente constituida que perdura através de suas modificações accidentais. Essa perdurabilidade, contudo, não é absoluta ou, pelo menos, não se pode afirmar como absoluta.

     O próprio Kant não pode deixar de considerar que caracteriza o homem essa capacidade de construir conceitos, nos quais, diz êle, não se encontram os rastros da sensação. Nem a quantidade, nem a qualidade, nem a relação, nem a modalidade são objectos de intuições sensíveis. Só são objectos da intuição sensível os sêres corpóreos. A quantidade é abstracta, e não é corporeidade. Os sêres corpóreos têm quantidade, não são, porém, quantidade. Há uma distinção entre o ser e o haver (no sentido de ter). Assim João é homem e tem humanidade; êle não é humanidade, mas dela participa, ou seja, há, nêle, também, o logos da humanidade, sem ser humanidade.

     As coisas sensíveis revelam o que tem e o que são, mas revelam-no à nossa mente.

     Não há a quantidade em si, nem a qualidade, nem a relação, nem a modalidade. Jamais afirmaram outra coisa os grandes filósofos do passado. Também não afirmaram que fôssem apenasmente formas puras da nossa mente, mas estructuras noético-eidéticas, que tem fundamento nas coisas sensíveis, que estavam confusas nas coisas sensíveis, que a inteligência pode captar e distinguir. Se a experiência fôsse apenas a sensação bruta, seria incompleta, e tal experiência pode tê-la o animal e a criatura em seus primeiros dias. A mente humana realiza, porém, um trabalho de ascese, de distinção, de esquematização noético-eidética das sensações. A quantidade é aquela propriedade que separa o ser corpóreo dos outros. E por meio dela que um corpo pode dividir-se em partes indivíduas, independentes da natureza do todo. Implica a extensão, a tensão que se ex-tende, que tende para fora de si mesma, como a qualidade é a in-tensão, a tensão que tende para si mesma. Se a extensão brota da criatura corpórea não se identifica com ela, como o queria Descartes; é apenas uma propriedade da sua essência.

     Não há intuição sensível da quantidade, tomada isoladamente, mas há intuição sensível dela, tomada confusamente nos sêres corpóreos. É a mente que a abstrai do componente sensível, como abstrai a qualidade, a relação e a modalidade. Não são, pois, puras formas do entendimento sem qualquer fundamento real fora do entendimento. Se o entendimento constrói os conceitos eidético-noéticos dessas categorias não os faz impondo-os às coisas corpóreas, mas extraindo dessas, mentalmente, o que nelas está concretamente. Êste ponto é o mais importante de considerar. Tais categorias não serão meras ficções, mas entes de razão com fundamento nas coisas (cum fundamento in re).

     Como esquemas eidético-noéticos não provêm das intuições sensíveis, já estructurados como tais. Nossa mente os estructura, fundada na própria experiência; ou seja, são parcialmente empíricos e parcialmente abstractos.

     E por que é possível construir uma lei como a da conservação da substância?

     Ela é possível desde o momento que a mente humana constrói o conceito de regularidade das leis universais. Essa lei é a priori, afirmará um kantiano, pois como poderíamos garantir que os factos sucederão sempre obedientes a certas normas invariáveis, partindo apenas da experiência? É esta a dúvida que provoca a inducção. Como pela observação dos factos particulares poderemos alcançar a uma lei geral? A aceitação da regularidade dos factos, ou a obediência à lei é um imperativo, é imprescindível para que a inducção possa ser válida e não permanecer apenas no campo da probabilidade.

     Ora, a mente humana não é apenas captadora, armazenadora e coordenadora das imagens percebidas. Ela é capaz de abstrair o que ultrapassa a singularidade, a particularidade dos factos. E tal é possível desde o momento que é ela capaz de formar conceitos (universais); antes, não. A discussão dêste ponto cabe, pois, à análise da validez da inducção, o que já foi feito e de modo definitivo na Filosofia.

     A mente humana é capaz de construir esquemas abstractos do que não está totalmente constituído da intuição sensível, do que não é apenas material e corpóreo. Essa capacidade imaterializadora implica uma actividade imaterial, porque a matéria não é capaz de abstracções, e sofre sempre determinações singulares, registrando os factos singularmente, e não universalmente.

     Essa capacidade de nossa mente, da mente racional, inteligente, é algo que se opõe, fundamentalmente, à actividade meramente material, singularizadora por excelência. Mas, note-se que percebemos a repetição de factos, a repetição dos mesmos aspectos, das mesmas condições, que dão como resultado as mesmas decorrências; ou seja, da disposição das mesmas condições decorrem as mesmas conseqüencias. Há, assim, uma regularidade, a presença de normas que captamos da nossa experiência. Os milharais dão sempre milho, as macieiras sempre maçãs. Há uma legalidade nos factos da nossa experiência. Poderíamos juntar aqui exemplos sem fim da presença dessa legalidade, da subordinação dos factos a normas gerais. O juízo: há uma legalidade dos factos da natureza, em que dadas as mesmas condições decorrem as mesmas conseqüencias, é algo que a experiência ajuda mostrar. Ora, a formação dos universais revela a presença constante dos mesmos elementos estructurais. A idéia de lei é uma idéia perfeitamente fundamentada na experiência. Aceitá-la como universal pode ser considerado como uma postulação nossa que, posteriormente, pode ser demonstrada num estágio mais alto do conhecimento humano. Mas, de qualquer forma, está fundada na própria experiência. Sua prioridade nas novas observações é uma conseqüência do próprio proceder da nossa inteligência, em que as conquistas obtidas presidem, depois, às novas experiências, e actuam, posteriormente, como elementos dados apriorìsticamente. É verdade que Kant sabia que as formas puras do entendimento eram psicològicamente construídas através de uma gênese psíquica do homem, mas que passavam, posteriormente a actuar apriorìsticamente na coordenação das novas intuições sensíveis. Pois o mesmo se dá com a concepção de legalidade. O racionalismo-empirista dos tomistas, que seguem assim a linha aristotélica, fundava-se na racionalização da própria experiência, com o alcançar de estágios cada vez mais complexos que presidiam novas experiências. O papel do nosso intelecto em sua actividade noética consiste em extrair os universais dos factos singulares da experiência, a vivência sensível, imprimindo em si mesmos os esquemas (species), que actuariam, posteriormente como elementos a priori acomodados para novas assimilações noéticas.

     O princípio de causalidade não e uma imposição do espírito humano a experiência. E o que provamos na parte em que justificamos os princípios fundamentais da filosofia clássica. A inteligência humana não é algo abissalmente separado do restante do existir. O homem não e um estrangeiro no mundo cósmico, como o kantismo parece querer fazer compreender, sem justificar de modo algum essa concepção. O abismo no ser não se justifica. Nem tampouco se justifica a pretensa revolução que Kant pensa ter operado na Filosofia, que êle iguala a revolução copernicana.

     Diz-se que até Copérnico era crença geral que a Terra permanecia imóvel no centro do mundo, e que os planêtas e as estrêlas giravam à sua volta. Na verdade, essa era a maneira comum de considerar-se a astronomia. Dizemos comum, porque Tomás de Aquino, antes de Copérnico, como ainda antes os pitagóricos, sabiam que a Terra era um planêta, uma esfera, que girava em tôrno do Sol. Tomás de Aquino repetidas vêzes afirmou isso em seus extraordinários trabalhos. Contudo, é verdade, que a opinião comum não era essa. Estávamos aí no terreno que Tomás de Aquino chamava de opinável. E exemplificava com as estrêlas, que certamente eram muito maiores que a Terra, mas que, por falta de meios de comprovação eficazes, eram admissíveis opiniões contrárias, não um saber científico.

     Kant atribuía à sua obra uma verdadeira revolução copernicana na Filosofia. Até êle - dizia - considerava-se a natureza como imóvel, e que o entendimento girava em tôrno dela e reflectia as suas leis. Por isso, a razão não compreendia por que são necessárias as leis. Pensando-se de modo inverso, tudo se modifica. Não é a razão que gira em torno da experiência e reflecte suas leis, mas sim a experiência que gira em redor da razão, e suas leis reflectem nossa própria natureza, que é um produto da nossa razão. Portanto, é para nós necessário o que a nossa mente cria como necessário.

     As leis da natureza são criações de nossos processos cognoscitivos, e nossas sensações nada mais são que respostas de nossa mente às impressões exteriores. Neste caso, que podemos conhecer das coisas exteriores senão o que pensamos conhecer? Como são as "coisas em si" nada podemos saber e, conseqüentemente, tôdas as respostas da Metafísica perdem sua validez, e a coisa em si permanecerá para sempre sendo uma incógnita para nós. E que podemos dizer da coisa em si? Se dizemos que existe, não esqueçamos que "existência" é apenas uma categoria, que é uma unidade ou uma multiplicidade, que é regida pela causalidade ou não, que é necessária ou contingente, tudo isso são categorias e nada mais. Sabemos apenas que há o outro lado da experiência, algo que nos é desconhecido, não, porém, totalmente desconhecido para o próprio Kant, que aqui se contradiz, porque sabe que o outro lado há, e que é incognoscível por nós. Êsse ser, que escapa à nossa experiência, não é objecto, portanto, da experiência, e pode ser apenas pensado pelo nosso espírito, nous, por isso é um númeno. E é do númeno que se ocupa a Metafísica.

* * *

     Há uma apoditicidade lógica, uma apoditicidade ontológica e uma apoditicidade ôntica.

     A primeira demonstra-se pelo rigor de necessidade lógica, como o juízo "Deus existe" é apodìticamente lógico, porque, na idéia de Deus, está inclusa, necessàriamente, a sua existência, pois é incedível, lógicamente, a não existência de Deus. Entretanto, ontológicamente, essa existência não tem apoditicidade, porque da meramente lógica não se conclui a ontológica imediatamente.

     Conseqüentemente, para alcançar a apoditicidade ontológica de tal juízo, impõe-se uma demonstração apodítica. A afirmação da existência, ou seja, que a sua existência é necessária, é nec-cedível, que a sua inexistência seja impossível, incedível também, ou, então, pela apoditicidade ôntica. Dêste modo, note-se a apoditicidade da existência implica uma necessidade dupla:

     a) necessidade da existência;

     b) necessidade da recusa da não existência.

     Temos, aqui, a diferença entre a necessidade absoluta e a necessidade hipotética.

     O ser, cuja existência é absolutamente necessária, é o ser ao qual se não pode negar nenhuma das duas necessidades: a necessidade de ser e a impossibilidade absoluta de não-ser. Ora, o conceito lógico de Deus implica, lògicamente, um ser que necessàriamente existe, cuja não existência é absolutamente impossível; ou seja, recusa-se necessàriamente a sua não existência. Do contrário, Deus não seria Deus, mas um outro ser qualquer, ao qual não se poderia predicar a divindade suprema. No entanto, essa apoditicidade lógica não é ainda ontológica (e muito menos ôntica, pois a prova da onticidade, da existência singular da Divindade, não decorre da necessidade lógica do seu conceito). Um ser finito qualquer, que existe (mesmo que fôsse êle ficcional, como poderia afirmar um criticista levado à máxima abstracção da filosofia de Kant), não teria em si mesmo a sua razão de ser, porque seria uma ficção minha, tua, vossa. Tal ser, necessàriamente, exige outro que o sustente, que lhe dê o ser, se é ficcional ou em outro, ou, então, êle mesmo seria sua razão de ser, e necessàriamente existiria. Um ser contingente, porém, é aquêle ao qual a segunda necessidade pode ser negada, pois a ficção que construí, se existe necessàriamente, poderia também não existir. Assim, o efeito de uma causa, se existe, existe necessàriamente a causa de sua existência, já que ser contingente é não ser necessário, e é aquêle, cuja não existência não implica contradição, como o cair ou não este objecto que tenho nas mãos. Sabemos que as possibilidades das coisas contingentes podem ser contraditórias, pois o que pode existir e pode não existir, é potencialmente contraditório; mas, se existe, exclui, automàticamente, a não existência. Assim, êste objecto pode ser lançado ou não ao chão; posso segurá-lo nas mãos ou deixá-lo cair, sem que tais possibilidades, que são contraditórias, impliquem contradição em sentido ontológico, porque, como ser contingente, pode-lhe acontecer isto ou não acontecer isto. Mas, se êsse objecto é lançado ao chão, há necessàriamente causas que o levam a cair e não a suster-se. Essa necessidade, que se dá ao acto, é chamada necessidade hipotética. O ser absolutamente necessário é aquele cuja não existência é impossível. A queda dêste objecto seria absolutamente necessária se ela fôsse necessária por uma razão ontológica, o que ela não tem. O Ser Supremo (Deus para as religiões) tem de ser absolutamente necessário, e é impossível e absurdo admitir-se a sua não existência.

     Na Filosofia Concreta, "alguma coisa há" é um juízo necessário por postulação, e que tem apoditicidade ôntica, porque é absolutamente improcedente afirmarmos que "nenhuma coisa há", porque a própria enunciação dêste juízo nega absolutamente validez ao mesmo. Mas, como chegarmos à necessidade ontológica de que alguma coisa necessàriamente há; ou seja, que necessàriamente há alguma coisa?

     Não poderia dar-se o nada absoluto? Em vez de julgarmos, de pensarmos, de discutirmos, de investigarmos, nos substituiria um imenso vazio, um nada absoluto. Já mostramos que em nós tudo se rebela a essa possibilidade. É uma afirmação psicológica, afectiva em nós, da impossibilidade do nada absoluto, da substituição possível do ser pelo nihilum, pelo nada absoluto. É êle impossível antes, e é êle impossível depois. Contudo, poderia ter sido possível que nada existisse? Surge, então, a velha pergunta, que Heidegger renovou: Por que antes o ser que o nada? Por que é preferido antes o ser que o nada? Por que não há a substituição? Seria possível a substituição do nada pelo ser, e em vez de haver alguma coisa, não haver absolutamente coisa alguma?

     Demonstramos em "Filosofia Concreta" que essa pergunta revela um pseudo-problema. Tal pergunta não tem validez ontológica, mas apenas uma validez psicológica em face da decepção moderna tão exacerbada pelo nihilismo activo-negativo de nossa época.

     Resta-nos examinar agora se o juízo "alguma coisa há" tem ambas necessidades. Uma já demonstramos apodìticamente. Resta-nos a outra: o nada poderia substituir o ser?

     Alguma coisa há tem a necessidade ôntica, porque é impossível que não haja coisa alguma. A própria postulação desse juízo afirma que alguma coisa há. Ora, o que tem a necessidade ontológica tem, pelo menos, uma necessidade hipotética. Mas esta ainda não é suficiente. O que procuramos é a necessidade ontológica de alguma coisa há. Havendo alguma coisa, ou alguma coisa começou a ser, depois de precedida pelo nada absoluto (nihilum), ou sempre houve alguma coisa. Ora, demonstrou-se apodìticamente que o nada absoluto não pode ter antecedido a alguma coisa, bem como foi demonstrado que sempre houve alguma coisa. Conseqüentemente, o haver de alguma coisa tem uma necessidade ontológica e não hipotética. Seria hipotética se fôsse apenas um possível e, neste caso, seria um possível do nada absoluto (nihilum), o que é absurdo, como vimos. Portanto, só resta que sempre houve alguma coisa necessàriamente. Êsse haver tem, portanto, a necessidade ontológica. Porque há alguma coisa, o haver do ser é ontològicamente necessário. Dêste modo, encontramos a apoditicidade da necessidade ontológica de alguma coisa há.

     A conseqüência, que se obtém, é a seguinte:

há necessàriamente alguma coisa e necessàriamente é impossível não haver alguma coisa.

     Ora, tal juízo possui a apoditicidade que desejava Kant, e pode êle fundar objectivamente a Metafísica. Nenhuma crítica, nenhuma objecção, nem a do cepticismo rígido poderia destruí-lo. E é sôbre êle que se fundamenta tôda a análise dialéctica concreta de nossa filosofia.

* * *

     É o juízo "alguma coisa há" um juízo analítico ou um juízo sintético a priori? Ante o kantismo, a pergunta é justificada e exige resposta cuidadosa.

     Está contido ou não no conceito de alguma coisa o haver?

     Lògicamente, não; mas ontològicamente sim. E por que esta distinção e aparente contradição? É fácil explicar.

     Alguma coisa (áliquid), como o mostramos, é um conceito que expressa outro que, o que se distingue.

     Ao dizer-se alguma coisa não se diz que , porque haver é dar-se, é positivar-se, é afirmar-se. Quando se diz "alguma coisa há" afirma-se que se posiciona, se positiva alguma coisa (outro que) e significa dizer que se recusa o não haver, recusa-se o nenhuma coisa há, seu contraditório.

     Por sua vez, o conceito de haver implica alguma coisa, porque o haver de nada não é haver. Se o haver se dá, alguma coisa se dá. Dizer-se "alguma coisa há" é dizer-se dá-se o haver de alguma coisa.

     O haver é atribuído ao alguma coisa. Mas alguma coisa, ontològicamente, há, por que como poderia positivar-se alguma coisa sem haver? Ontològicamente, o alguma coisa implica o haver, como vimos, embora lògicamente não. Não há contradição aqui, porque a Lógica dedica-se ao exame dos conceitos em sua esquematização, e a Ontologia examina os conceitos em sua possibilidade de ser. Eis, por que a simples demonstração lógica não implica a demonstração ontológica.

     A apoditicidade do juízo "alguma coisa há" é ontológica e ôntica, porque a sua postulação é necessária de qualquer modo, pois seria válido mesmo que puséssemos em dúvida seu valor, porque duvidar é provar que alguma coisa há. A mera discussão de sua validez é suficiente para dar-lhe a validez ôntica apodítica, é demonstrar apodìticamente a sua validez.

     Resta-nos saber se tal juízo é um juízo sintético a priori.

     Nossa experiência, mesmo no sentido kantiano, não nos prova que alguma coisa há?

     Se somos capazes de especular sôbre o que é possível de uma experimentação possível não prova que alguma coisa há?

     O juízo alguma coisa há revela-se de modo exigente e positivo. Não é um juízo analítico, é sintético sem dúvida, e comprova-se pela mais comum experiência, como o exigiu Kant. Mas, note-se, é válido aposteriorìsticamente e aprioristìcamente. É um juízo sintético a posteriori, quando a experiência a revela, e é a priori, porque dispensa até a própria experiência kantiana, porque dispensa a nós mesmos, a nossa experiência, pois poderíamos não ser, sem que alguma coisa há deixasse de ser verdadeiro apodìticamente.

     Queremos com isso, apenas, dar mais uma demonstração de que é possível a Metafísica, até dentro da própria posição de Kant34.


Notas de Rodapé:

32 O princípio de contradição impõe-se por aclaramento da análise e das implicâncias que provocam o juízo "alguma coisa há", e a validez desse princípio é encontrada através dessa mesma análise. Não parte dêle a Filosofia Concreta para provar as suas teses fundamentais, mas surge ele por decorrência inevitável do que é apodìticamente demonstrado.
33 Em nosso "Tratado de Esquematologia" examinamos as conquistas obtidas e oferecemos algumas contribuições nossas, bem como análises esquematológicas, que favorecem melhor compreensão das idéias de Kant e promovem novas sugestões.
34 A doutrina de Kant é falsa em seus fundamentos, em si mesmo e em sua finalidade.
Em seus fundamentos, quanto à teoria cartesiana da percepção externa e da maneira como concebe os juízos sintéticos a priori; em si mesma, porque não demonstra devidamente sua afirmativa sôbre as formas puras da sensibilidade e, sobretudo, a submissão total da intuição às mesmas e, em seu têrmo, porque conduz, através do agnosticismo, ao cepticismo mais absoluto, o que é filosòficamente um êrro rotundo.