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Em se tratando de crianças, não há limite para a arrogância dos adultos.
É o velho mito do adulto desidratado, de novo.
As crianças pequenas não são tão altas, tão pesadas e também não são mais inteligentes do que eu.
Não tão altas quanto eu? Verdade.
Não tão pesadas quanto eu? Certamente verdade.
Não tão inteligentes quanto eu? Há, há, há.
Não existe tarefa mais difícil, do ponto-de-vista intelectual, para um adulto do que aprender uma língua estrangeira. Poucos adultos conseguem aprender uma língua estrangeira fluentemente. O número de adultos que consegue falar uma língua estrangeira impecavelmente e sem o menor sotaque é tão pequeno que chega a ser insignificante. A quantidade mínima de adultos que consegue aprender um idioma estrangeiro está sujeita à inveja e admiração universal.
Eu preferiria ser capaz de falar uma língua estrangeira a desempenhar qualquer outro ato intelectual no mundo. Eu gostaria de falar português, japonês ou italiano - mas aceitaria qualquer coisa. Eu já vivi por breves ou longos períodos em centenas de países diferentes e não consigo dizer uma frase gramaticalmente correta em nenhuma língua, muito menos com a pronúncia certa. E não é que não tenha tentado. Eu tentei com vontade.
Eu tenho aqueles livrinhos de frases em mais de cinqüenta idiomas diferentes, e tenho procurado usá-los. Pelo menos tenho tentado. Ninguém espera que os ingleses ou americanos façam ao menos uma tentativa. Quando fazemos, eles acham que é charmoso.
Eu entro em um táxi francês e digo algo como: "Eu-táxi-hotel."
O motorista olha por sobre os seus ombros e diz em inglês: "Onde é que você quer ir Jack, para o hotel?"
E o faz com pronúncia americana. Ele é um pouco mais novo do que eu. Assim, deduzo que era um menino durante a invasão americana e que morava na zona americana.
Qualquer adulto que deseje um rápido complexo de inferioridade só precisa entrar num concurso de aprendizagem de línguas com uma criança de dezoito meses.
Suponha que pegássemos um brilhante homem de trinta anos, vencedor de bolsa de estudo em Rodes e ganhador de medalha de ouro nas Olimpíadas, no auge da sua capacidade. Supunha que lhe disséssemos: "Pete, vamos mandá-lo para uma cidadezinha no centro da Itália e você vai morar lá com uma família por dezoito meses. Tudo o que tem a fazer é aprender italiano."
Vamos imaginar que, neste momento, apareça uma criança de dezoito meses, de andar ainda incerto, e nós lhe dizemos para levá-la junto com ele.
Para o inteligente homem de trinta anos muitas instruções.
Para a criança de dezoito meses - nenhuma instrução.
Um ano e meio depois, o nosso brilhante adulto falaria italiano bem - com um terrível sotaque americano.
A criança, que não havia recebido instrução alguma, falaria muito bem italiano - com o preciso sotaque da casa, da cidade, e daquela província italiana.
Todas as crianças são gênios lingüísticos.
Para uma criança nascida em Filadélfia, esta noite, o inglês é uma língua estrangeira. Não é mais nem menos estrangeira do que alemão, italiano, swahili ou urdu.
Ao completar um ano já está entendendo bastante e começando a dizer as primeiras palavras.
Aos dois anos de idade, compreende muito e tem uma capacidade rudimentar de falar o idioma.
Aos três anos, entende e fala fluentemente de modo a sair-se bem em quase todas as situações.
Ao completar seis anos, fala perfeitamente de acordo com o seu ambiente. Se as pessoas da vizinhança dizem: "Eu vi ele quando ele fez isso," assim a criança também o dirá - isso é o adequado no seu ambiente.
Se, por outro lado, seu pai for um professor de inglês no University College de Londres, ele falará o inglês clássico com o sotaque característico, porque isso é o adequado no seu meio ambiente.
Se nasce numa casa onde duas línguas são faladas, falará as duas.
Se as pessoas de sua casa falam três idiomas, ela falará os três - e assim por diante, se não ad infinitum, pelo menos enquanto existirem línguas.
É o maior milagre em termos de aprendizagem que eu conheço.
A primeira vez que conheci Avi foi no Rio, quando ele tinha nove anos. Eu poderia tê-lo estrangulado com prazer.
O que me perturbou foi o fato de ter pedido desculpas pelo seu inglês, explicando que o havia aprendido na escola. Ele fez isso num esplêndido inglês com sotaque da B.B.C. O sotaque da B.B.C. é melhor do que o de Oxford, que tende a ser um tanto piegas.
Ele pediu desculpas logo a mim - com esse meu sotaque do norte de Filadélfia. (O sotaque do norte de Filadélfia é muitas vezes o resultado de sinusite crônica causada pelo mau tempo).
Se estou falando para uma platéia erudita, eu consigo razoavelmente falar como um deles até alguém me aborrecer. Se isto acontece eu volto ao meu sotaque do norte de Filadélfia.
Um dos presidentes americanos dizia "Cuber" cada vez que se referia a "Cuba."
A imprensa ridicularizava-o constantemente, mas ele continuava a pronunciar "Cuber." Você pode tirar o menino de Boston, mas não pode tirar Boston de dentro do menino.
Avi tinha nascido no Cairo, numa comunidade de língua inglesa. Seus avós espanhóis moravam com ele e assim aprendeu o espanhol. Mudaram-se para Haifa, (ídiche, alemão e hebraico) e os avós turcos foram morar com ele, apresentando-lhe o idioma turco. Finalmente, mudaram-se para o Brasil que lhe deu o português.
Todos os computadores do mundo interligados jamais seriam capazes de ter uma conversação fluente ao nível de uma criança de dois anos e meio em inglês, iídiche, turco, hebraico, espanhol, português e muito menos com sotaque da B.B.C.
Como é, então, que esse milagre dos milagres acontece?
Nós nos enganamos afirmando que fomos nós que os ensinamos. Tolice.
Ninguém viveria o bastante para tanto. Existem 450.000 palavras na língua inglesa e 100.000 num vocabulário de primeira classe.
Nunca ninguém precisou dizer a uma criança de dois anos: "Olhe aqui, Joãozinho, isto se chama óculos." Em vez disso dizemos: "Onde estão meus óculos?"
"Meus óculos precisam ser limpos."
E o Joãozinho, que é um gênio lingüístico, diz para si próprio que aquelas coisas se chamam óculos.
Esta capacidade, incrível capacidade de aprender uma (ou dez) línguas nos primeiros três anos de vida, é um milagre além do nosso entendimento ao qual não prestamos a devida atenção.
E um milagre observado como milagre somente quando não acontece.
Quando uma criança pequena não aprende a falar, nós imediatamente compreendemos a extensão do milagre em toda a sua glória e complexidade.
Quando isso acontece, pais de todas as partes do mundo imploram, pedem emprestado e até roubam a quantia necessária para vir a Filadélfia e aos Institutos, solicitando-nos ao chegar: "Ensine-nos a fazer o milagre acontecer."
Um amigo muito chegado, major de infantaria, serviu no Japão depois da Segunda Guerra Mundial. Ele havia estado lá pouco mais de um ano quando ouviu crianças falando no quintal. Olhou pela janela e constatou que uma das crianças era a sua.
Voltaram para cá depois de três anos. Quando retornaram ele e sua esposa tinham um vocabulário de oito palavras: soyonara, konnichi-wa, arrigato, ohayo-gozaiamasu e assim por diante.
Seus amigos japoneses não entendiam suas palavras em japonês, mas os americanos entendiam.
Cara Caputo, que aprendeu japonês nos Institutos, foi visitar uma amiga no Japão quando tinha seis anos. Ao chegar lá, o ano letivo estava começando, então ela se matriculou e foi para a primeira série com sua amiga japonesa. Sem o menor problema.
É mais fácil ensinar a uma criança de um ano uma língua estrangeira do que a uma de sete anos.
Isto porque todas as crianças pequenas são gênios lingüísticos.